quinta-feira, 17 de abril de 2014

Promotora quer explodir linha direta Papuda-Planalto. AGU protesta



O pedido de quebra de sigilo de celulares do Palácio do Planalto feito à Justiça por uma promotora do Distrito Federal atinge também os aparelhos usados em dois outros Poderes da República: o Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional. As antenas localizadas na região apontada como alvo pelo Ministério Público cobrem toda a área da praça dos Três Poderes, na região central de Brasília, que abriga as sedes do Executivo, do Legislativo e do Judiciário.

A promotora Márcia Milhomens Sirotheau Corrêa encaminhou a solicitação de rastreamento à Vara de Execuções Penais do Distrito Federal em 27 de fevereiro, no escopo da investigação sobre o suposto uso de um telefone celular na prisão pelo ex-ministro José Dirceu. Condenado pelo STF no processo do mensalão, Dirceu está preso desde novembro no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília. Técnicos da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) confirmaram à Folha o alcance do pedido dela.

Em seu requerimento, a promotora apontou duas coordenadas geográficas sem indicar a que áreas correspondiam. Uma é a da Papuda e a outra cai diretamente no Planalto, onde a presidente Dilma Rousseff despacha. Ao tomar conhecimento da extensão do pedido, o governo reagiu imediatamente e entrou anteontem com a reclamação disciplinar contra a promotora na Corregedoria do Conselho Nacional do Ministério Público. O órgão tem o poder de avaliar a conduta de seus integrantes.

A AGU (Advocacia-Geral da União), órgão que representa juridicamente o governo federal, critica a solicitação "ampla, geral e irrestrita, sem qualquer explicação". Na reclamação disciplinar, à qual a Folha teve acesso, a AGU afirma que a quebra, se autorizada, configuraria uma "verdadeira devassa" de todos os Poderes da República. O órgão diz, no mesmo documento, que as estações de rádio base que captam sinais de celulares usados no Palácio do Planalto são as mesmas que cobrem o Congresso Nacional e o STF. Milhomens pediu para rastrear as ligações feitas entre os dias 1º e 16 de janeiro deste ano. Ela reafirmou ontem, por meio de sua assessoria, que só se manifestará sobre o caso nos autos do processo.

ALCANCE

Segundo a Folha apurou, a quebra do sigilo poderia listar ligações de deputados, senadores, ministros de Estado e até mesmo da cúpula do Ministério Público, instituição da própria promotora Márcia Milhomens, cuja sede fica a cerca de um quilômetro da praça dos Três Poderes. O rastreamento, mesmo com coordenadas específicas, poderia incluir ainda outros locais próximos, como a Catedral de Brasília e o Tribunal de Contas da União. Ou seja: pessoas comuns que fizeram ligações na região do Palácio do Planalto poderiam ser atingidas.

O requerimento da promotora pedia que operadoras de telefonia informassem as ligações efetuadas e recebidas, nas áreas indicadas, por meio das estações de rádio base --antenas usadas para chamadas que envolvem celulares. Especialistas em telecomunicações ouvidos pela Folha estimam que cada antena abrange sinal em um raio médio de quatro quilômetros. Por isso, o pedido, da forma como foi feito, atinge toda a praça dos Três Poderes.

Para o governo, segundo a reclamação da AGU, a promotora adotou um "procedimento inteiramente inédito e heterodoxo" em sua apuração. O documento, assinado pelo ministro da pasta, Luís Inácio Adams, afirma que se trata de uma "aparentemente insólita iniciativa de obter os dados sigilosos". O Supremo Tribunal Federal tem se manifestado contrariamente a quebras de sigilo baseadas em pedidos com formulações genéricas.(Folha de São Paulo)

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