terça-feira, 14 de julho de 2015

Solução: dissolvam-se como famílias e reagrupem-se como clubes de futebol



Em tempos de inflação sufocante e desemprego florescente, surgiu uma saída para os agrupamentos de brasileiros encalacrados. Todas as famílias em dificuldades devem dissolver-se como famílias e reagruparem-se como clubes de futebol. As famílias não têm a quem recorrer. Os clubes dispõem da simpatia do governo e do apoio da bancada da bola no Congresso. Para as famílias, nada. Para os clubes, parcelamento camarada das dívidas, perdão de encargos e a renda de loterias novas para reforçar o caixa.

Sem fazer muitos questionamentos, os senadores aprovaram na noite desta segunda-feira a medida provisória que cria o Profut, Programa de Modernização do Futebol Brasileiro. Sob atmosfera de ‘vamos lá minha gente’, parcelaram-se em 240 meses as bilionárias dívidas fiscais, previdenciárias e trabalhistas dos clubes. Para abastecer-lhes as arcas, criaram-se duas novas loterias. Como os mimos já haviam passado pela Câmara, seguiram para a sanção presidencial.

O futebol brasileiro é feito de dívidas e nostalgia. Suas glórias só existem no replay esmaecido dos lances de um passado remoto.
Embora geridos por homens de bens, os clubes nacionais se esqueceram de dar lucro. Deus, como se sabe, é brasileiro. Mas o diabo é europeu. E aproveita-se da penúria dos clubes para levar embora craques mal apartados da mamadeira. Sobre os gramados nacionais, ermos de talento, brotam apenas ideias exóticas —como mais esse Probola.

A proposta aprovada no Congresso impõe um lote de exigências de gestão e responsabilidade financeira. Que serão desrespeitadas ao longo do tempo. Até o lançamento de um novo plano de socorro. Sob Lula, criou-se a Timemania, uma loteria cuja renda foi destinada prioritariamente aos clubes. Dizia-se à época que a grana serviria para liquidar-lhes as dívidas. A nova operação-resgate é a mais eloquente evidência de que não funcionou.

Pois agora, além de rolar os débitos dos clubes, o Estado deu à luz mais duas loterias: uma raspadinha chamada Lotex e uma bolsa de apostas sobre os resultados de competições esportivas. São escândalos esperando para acontecer. A exploração não ficará com a Caixa Econômica Federal. A proposta enviada para a sanção de Dilma autoriza a privatização.

Sete em cada dez brasileiros que testam a sorte nos jogos de azar oficiais têm renda inferior a três salários mínimos. Além da Timemania, o cassino estatal já administra os seguintes jogos: Loteria Federal, Loteria Esportiva, Loteria Instantânea, Mega-Sena, Lotomania, Quina, Dupla Sena, Lotofácil e Lotogol. Na prática, todos esses jogos são uma forma disfarçada de tributar o pedaço mais pobre da arquibancada.

Juntos, os clubes de futebol conseguem muito mais do que as famílias brasilerias. Injusto, muito injusto, injustíssimo. Não resta a você senão correr para fundar o Fulano Futebol Clube, que se juntará ao Beltrano Clube de Regatas. Ex-cartola, o senador Zezé Perrela (PDT-MG) celebrou o novo Probola: “Não há nenhum tipo de privilégio. Houve, sim, um bom senso do governo de entender que, salvando o futebol está salvando a alegria do povo''. Reagrupado como clube, você pode requerer do governo a troca da sua alegria por algo mais palpável.

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